“É impossível falar de Amelia sem falar da Casa da Flor, assim como não é possível falar da Casa da Flor sem falar de Amelia.”
“A Casa da Flor é um produto de onirismos. É o resultado dos sonhos e do trabalho visionário de Seu Gabriel para criá-la, e dos sonhos e do trabalho obstinado de Amelia para preservá-la”.
Conheci Amelia ainda na década de 1980, numa audiência por ela solicitada ao Prefeito de São Pedro da Aldeia.
Na ocasião eu era membro do Conselho de Cultura e o assunto da entrevista era, como não podia deixar de ser, em se tratando de solicitação de Amelia, a Casa da Flor e a importância de se preservar um bem cultural do município que, inclusive, já havia transcendido as nossas fronteiras e estava tombado pelo Instituto Estadual do Patrimônio Artístico e Cultural – INEPAC.
Fiquei profundamente impressionado pela exposição feita pela Amelia. Estava diante de uma professora de artes, de uma mulher de elevada sensibilidade, de uma pesquisadora que havia se especializado na obra de Seu Gabriel, compreendido o seu valor, se apaixonado por ela, e que lutava desesperadamente para preservá-la.
Gradual e lentamente, através de entrevistas com Seu Gabriel, de quem se tornou amiga, do resgate de todo o tipo de informação sobre o imóvel e seu construtor, de documentação fotográfica minuciosa dos detalhes arquitetônicos e decorativos da casa, da publicação de artigos, da realização de palestras em eventos artístico-culturais, da organização de exposições, Amelia havia se transformado na principal referência e na memória viva da Casa da Flor, e sua principal divulgadora.
Desde então passei a acompanhar de perto a luta de Amelia, a sua obsessão missionária no sentido de sensibilizar pessoas, as administrações públicas municipal, estadual e federal na busca de recursos para preservar o patrimônio – arquitetura primitiva e ingênua – para as gerações futuras.
Em 1987, como requisito para poder obter recursos, Amelia liderando um grupo de amigos e seguidores, criou a Associação dos Amigos da Casa da Flor, da qual foi Presidente e Secretária Executiva por diversos mandatos, destacando-se pela dedicação ao trabalho, muitas vezes em detrimento da sua vida pessoal.
Graças ao trabalho obstinado e dedicação de Amelia a Casa da Flor foi desapropriada pela Prefeitura, passou por várias obras de restauração, sendo que em 2012, após participar da Chamada Pública 015/2012 de Apoio ao Desenvolvimento de Museus e Instituições Museológicas, foi contemplada com recursos que possibilitaram uma grande obra de restauração que a preservará por muitos anos.
Em 2009, Amelia realiza um antigo sonho e publica seu livro “A Casa da Flor – tudo caquinho transformado em beleza”, fruto de uma pesquisa de mais de trinta anos que resgata a vida e a obra de Gabriel Joaquim dos Santos e, em 2016 consegue o tombamento da casa pelo IPHAN. Só quem conviveu com Amelia é capaz de avaliar o profundo sentimento de felicidade e realização pessoal de que foi tomada com essas duas realizações, após haver ultrapassado a barreira dos oitenta anos.
Amelia foi uma idealista, uma mulher de fortes convicções, determinada, que não se deixava abater diante das dificuldades, e também uma criatura romântica que absorveu a sabedoria do seu criador que ao explicar a sua fonte de inspiração afirmava “sonho para fazer e faço”.
Por Geraldo Ferreira, sócio fundador do Instituto Cultural Casa da Flor